Foto: Cristiano Xavier/OneLapse
Lá fora o inverno se estende como um lençol cinza sobre a cidade.
O vento caminha apressado pelas ruas desertas, sussurrando segredos antigos nas frestas das janelas.
As árvores nuas erguem os braços secos ao céu, como quem suplica ao sol um raio de calor perdido.
A chuva fina borda o ar, e a neblina faz do mundo um cenário de sonho.
Há um silêncio frio que parece desacelerar o tempo, como se o próprio relógio do universo se curvasse ao peso da estação.
Mas aqui dentro, as paredes são o abraço invisível que impede o frio de entrar.
O aroma quente do café recém passado espalha-se pela casa, um convite sutil ao aconchego.
Entre as mãos, a xícara é um pequeno sol particular, aquecendo os dedos e o coração.
E quando os olhos se perdem nas páginas de um livro, o inverno parece se dissolver: as palavras são cobertores que nos envolvem, histórias que nos levam para longe do frio, para terras onde o vento não alcança.
O corpo se enrosca no cobertor como quem encontra um porto seguro, e a alma, essa parte que o inverno lá fora não alcança, acende suas pequenas fogueiras de lembranças e esperanças.
O inverno lá fora convida ao recolhimento, mas é aqui dentro que o calor verdadeiro se revela: o calor da casa, do café quente, das páginas que nos embalam, das palavras que aquecem, do olhar que conforta, da chama quieta daquilo que nos habita.
Há um inverno no mundo e há um inverno em nós.
O de lá, impiedoso, açoita as ruas e faz murchar as flores;
O de cá, às vezes mais frio, pede que sejamos o abrigo uns dos outros.
E enquanto lá fora o gelo insiste em dominar, aqui dentro resistimos: somos lareira, somos lume, somos essa promessa de primavera guardada no peito, esperando apenas o momento certo para florescer.