quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

O PÁSSARO NA GAIOLA FAZ PLANOS



Em muitos momentos das nossas vidas somos como um pássaro em uma gaiola, acostumados com a frieza do lugar e acomodados com o que temos ali.
Esse pássaro anseia pela liberdade.
Ele se sente oprimido e desconfortável onde está, quer bater as asas.
Voar como os outros pássaros, alcançar os céus.

O pássaro na gaiola sonha com isso todos os dias e faz planos.
Um dia ele finalmente encontra a gaiola aberta.
Se sente feliz só de pensar em como será sentir o vento, o pingo da chuva, o bater de suas asas, então ele sai da gaiola. No entanto, antes de finalmente bater as asas e voar, ele pousa sobre a gaiola e pensa:
“Mas espera aí. Como vou me alimentar, me proteger do frio e da chuva? E se eu me sentir só, se eu não conseguir, se não for capaz, e se eu me arrepender? E se...”

Então ele abre espaço para a dúvida, e não pensa que há uma infinidade de árvores para que ele se alimente dos seus frutos, se proteja do frio em seus vários galhos e construa seu próprio ninho para abrigar seus filhotes, que há centenas de pássaros por aí que vivem em liberdade.
O pássaro não se lembra da sua natureza: ser livre, por isso possui asas.
Mas ele não se lembra, a gaiola lhe roubou isso, e um tanto mais.

Ele só sente que não conseguirá, que não será capaz, dúvida de si mesmo. Pensa que ali, na gaiola, tem tudo o que ele precisa: água fresca, ração, cobertura.
Ele esquece que o que o “faz bem” também é o que o aprisiona.
E então, pensando no que pode perder e não no que pode ganhar, ele volta para a gaiola que o oprime e o entristece.
Ele continuará dando desculpas a si mesmo sobre o porquê de não ter voado. E dessa forma ele passará os seus dias sonhando com a liberdade, preso a uma gaiola que o oprime.
Mas nunca esquecerá que um dia viu a porta da gaiola aberta, mas sem coragem de bater as asas não voou.

Assim somos nós.
Todos os dias nós damos desculpas para não voar, para permanecermos presos ao que nos oprime, nos entristece, mas que nos mantém “seguros” em nossa zona de conforto.
Você não precisa permanecer na gaiola.
Bata as asas, você só saberá o que é voar quando jogar-se ao infinito.

Se sua escolha for permanecer nela, ainda assim escolha ser livre.
Você pode estar na prisão, mas ela não pode fazer parte de você.
Porém se sua escolha é voar e sentir o vento da liberdade, voe sem olhar para trás.
Há um mundo a sua frente preparado pra você, respire a liberdade e deixe ela fazer parte do seu ser.

A gaiola pode ser segura mas te aprisiona.
O vôo pode ser assustador, porque para voar é preciso render-se ao vazio, mas o vôo te liberta.

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

ATRIBUÍ SENTIDO AS AUSÊNCIAS




O que antes era, deixou de ser
A sua partida estilhaçou o meu mundo.
A ponte entre o seu infinito e o meu desmoronou.
As entrelinhas que nos uniam se romperam.

Quando eu nada mais podia fazer, eu esperei.
O tempo era de esperas, pois nenhuma pressa diminuiria nossas distâncias ou uniria nossos mundos.
O meu amor sobrevivia de esperas.

Chorei a impossibilidade dos afetos e o afago dos abraços.
Eu juntava os cacos e não podia atravessar a ponte.
Na margem do rio, eu sentei, chorei e esperei.

Meu universo se expandia nas miudezas.
Eu me refazia na simplicidade das ausências.
Me reconstruía no mundo que havia dentro de mim.

Aprendi que as esperas ensina mais que os reencontros, e fui deixando o inesperado acontecer.
Aprendi a plantar flores e descobri que eu era ensinada bem mais quando eu as colhia, pois enquanto eu as arrancava dos galhos, elas perfumavam as minhas mãos.

Ajustei meu caminho, me encontrei na estrada do destino.
Eu voltei, por muito tempo não estive aqui: dentro.
Estava com você em algum lugar que nem sei onde.

Meu desassossego cessou, retornei a minha inteiresa.
Eu era espaço da tua inabilitação, hoje sou espaço reconfigurado.
Seu "não retorno" me recompôs.
E foi a vida que descobri nos detalhes, escondidos na sua ausência, que meu todo foi preenchido.



quarta-feira, 1 de agosto de 2018

ME TORNEI O SILÊNCIO E O MAR

                      


Eu precisava fazer minha peregrinação
Aprender a lidar com as minhas perdas
Revisitar minhas ausências
Adentrar os meus mundos
Olhar para o mar desconhecido da minha alma.

O cais era meu ponto de partida
O barco era meu único companheiro 
O destino? 
O profundo oceano dentro de mim
Queria respostas para as minhas muitas perguntas.
O solitário das águas distantes era o caminho.

Mar adentro, numa tarde fria e cinza...
Eu era a tarde, e não sabia.
Hoje trago na memoria a primeira noite no escuro do mar.
Apenas as estrelas iluminavam o meu pequeno mundo
E brilhavam no oceano da minha escuridão.

Encontros e desencontros ficaram para trás.
Tantas chegadas e tantas partidas
Não sei em quais eu realmente estava lá.
O barco ja não se lembrava do cais.
Minha distância não era medida pelo meu afastamento
Eu ainda estava no cais e precisava, como o barco, adentrar ao mar.

Uma névoa densa cobria tudo ao redor
E eu sentia em meu corpo, o peso de uma vida inteira e de tudo que eu deixei para trás.
Um longo silêncio me afastava dos polos da minha vida.
Exausto por todo o peso que havia em mim, me abandonei ao sono.

Ao amanhecer senti que eu havia deixado o cais
Acompanhado o barco que deixou o ancoradouro.
Eu era como semente plantada que quer nascer
Descobrir os sinais que fariam eu me reconhecer.
Precisava saber de quantas dores era o meu silêncio.

Meu espírito estava solitário no mundo.
Cercado por muitas ilhas, eu apenas navegava.
No caminho me defrontei com correntezas, ventos e tempestades.
Eu continuava no leme.
Consciente de que havia me afastado da rota, ja não via horizonte onde eu pudesse chegar.

Apenas o barulho das águas.
Todo o exterior desapareceu.
Nenhum laço se quer com o mundo que deixei no cais.
Só havia um oceano sem fim a me olhar
O sol me abria caminho, e eu seguia.

Quando parti levei comigo minhas muitas guerras.
Fui em busca da paz que me faria voltar.
No mar que havia em mim, eu começava a ver uma direção.
A passagem do tempo não era sentida;
E de longe, parecia, que era o mundo que envelhecia.

As águas bravias me jogavam contra as pedras
Me chacoalhava e arrancava partes de mim
Com as partes que perdia, eu me reconstruia.
Foi em horas assim de desespero, que aceitei as perdas, me agarrei as renúncias e me redescobri.

As águas brandas resgatou as minhas muitas lembranças 
Momentos que me deixaram algo durável
Relembrei momentos inteiros que valeram a pena
As águas passaram como passa o tempo.
E pouco a pouco eu me fazia mais humano.

As tempestades que enfrentei me pareceram desfavoráveis
Mas elas lavavam tudo em mim, e levavam tudo que não era eu.
Eu era viajante do silêncio, dos dias curtos e das longas noites
E como água de nascente, eu me renovava.

A correnteza me levou à caminhos que não pensei chegar..
Eu fui a escuridão, o medo, o ruído e o nevoeiro
Muitas noites e dias, não sei precisar o tempo.
Simplesmente aconteceu: me tornei o sol, a paz, o silêncio e o mar
Eu já não era a tempestade que morava dentro de mim.

Na poesia do horizonte encontrei o meu lugar.
Refiz minhas partes, ajustei as rotas, me recompus por inteiro
Senti a brisa leve do sopro do vento.
Me senti um, com o céu e o mar
Encontrei meu tesouro, meu interior se tornou rico.

Quando eu não tinha mais nada a perder, ganhei tudo.
Quando deixei de ser eu, me encontrei
O tanto que busquei morava em mim
Fui tão longe para buscar o que estava  perto
Mas só a distância me fez encontrar

No profundo das águas deixei os rasos das minhas emoções.
Joguei no mar tudo que não era meu
As águas levaram medos, angústias, tormentos e meu velho mundo.
Outro alguém nasceu em mim, então senti falta do cais.

Eu não regressei, fiquei lá 
Quem voltou foi um outro eu
Aquele que encontrei no profundo do mar.




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